Igrejas e lojas fecham as portas após cobrança de ‘taxa de segurança’ no Andaraí: ‘Estamos apavorados’

A Paróquia São José e Nossa Senhora das Dores, na Rua Barão de Mesquita, suspendeu programação após ameaças — Foto: Madson Gama

Alvos dos criminosos incluem as paróquias São José e Nossa Senhora das Dores e São Cosme e São Damião

Igrejas e estabelecimentos comerciais no Andaraí, na Zona Norte do Rio, amanheceram sob ameaça e precisaram fechar as portas nesta quinta-feira, denunciam moradores. Segundo relatos, criminosos teriam ligado exigindo o pagamento de R$ 1 mil para que templos e lojas continuassem funcionando na região.

Aviso. Bilhete no portão informa sobre atividades canceladas na Igreja São José e Nossa Senhora das Dores, na Rua Barão de Mesquita — Foto: Madson Gama

Entre os alvos estão as paróquias São José e Nossa Senhora das Dores, na Rua Barão de Mesquita, a cerca de 400 metros do 6º Batalhão (Tijuca), responsável pela área, e São Cosme e São Damião, na Rua Leopoldo.

— Ligaram por volta de 11h pedindo para falar com o pároco. Disseram que não queriam ter problemas com as igrejas e pediram uma contribuição de R$ 1 mil, dizendo que iriam mandar uma conta para depositar ou uma pessoa para recolher a quantia pessoalmente. O padre disse que não poderia fazer isso, porque o dinheiro é da igreja. Então, responderam: “se você não fizer isso, vamos mandar fechar a igreja por tempo indeterminado” — detalhou uma testemunha.

Paróquia São Cosme e São Damião de portas fechadas após episódio de extorsão — Foto: Madson Gama

A paróquia São José e Nossa Senhora das Dores enviou um aviso aos fiés em grupos de mensagem informando sobre a suspensão de todas as atividades e afixou um cartaz com a informação na entrada da igreja. A São Cosme e São Damião também comunicou “que tudo foi cancelado”.

— Estamos apavorados. É muito ruim morar num lugar sem segurança. Fico com medo de chegar alguém se passando por fiel e fazer alguma maldade — queixou-se uma frequentadora.

Ligação anônima

No Grajaú, a Paróquia Nossa Senhora do Perpétuo Socorro também recebeu uma ligação de pessoa não identificada pedindo para falar com o padre na manhã de quinta-feira.

— Foi a primeira vez que recebemos esse tipo de ligação. Mas o padre não estava, e ficou por isso mesmo. Funcionamos normalmente ao longo do dia — disse uma secretária.

Questionada, a Arquidiocese do Rio de Janeiro informou que “algumas paróquias da região do Andaraí cancelaram suas atividades neste dia por prudência, devido à instabilidade e a possíveis conflitos registrados na região”.

A Paróquia Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, no Grajaú, funcionou normalmente mesmo após ligação atípica — Foto: Madson Gama
A Paróquia Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, no Grajaú, funcionou normalmente mesmo após ligação atípica — Foto: Madson Gama

O GLOBO percorreu a área ao longo da tarde de quinta-feira. Nas proximidades do Morro do Andaraí, diversas lojas estavam fechadas. Segundo comerciantes, a cobrança da chamada “taxa de segurança” deve ser paga mensalmente e é feita há pelo menos cinco anos. Atualmente, os pagamentos costumam ser efetuados via PIX, mas há ocasiões em que são recolhidos pessoalmente.

Conforme o fim do ano vai se aproximando, relatam testemunhas, os criminosos fecham o cerco contra quem não paga. Há cerca de dez dias começaram a pressionar os “inadimplentes”.

— Hoje, só abriu quem já paga a mensalidade. Quem não paga está sendo cobrado. Estabelecimentos de pequeno porte pagam em torno de R$ 400 por mês, mas esse valor pode chegar a R$ 6 mil para comércio de grande porte, como um mercado. Não tem como fugir; temos que incluir essa taxa na nossa despesa fixa. Se não pagar, sofremos retaliações. A loja começa a ser assaltada, por exemplo — contou uma lojista da Barão de Mesquita. — Até motoboys pagam, e muito caro. Eles não sobem e descem morro de graça. Antes, havia mais de 15 motos. Hoje, se tiver duas é muito.

Comércio fechado na Rua Leopoldo, no Andaraí — Foto: Madson Gama
Comércio fechado na Rua Leopoldo, no Andaraí — Foto: Madson Gama

Comerciantes reclamam ainda que, se percebem uma evolução nos negócios, os criminosos aumentam o valor da taxa.

— Dependendo da intimidade que você tem com quem recebe, a gente tenta argumentar, dizendo que não dá para aumentar o valor. Mostro até minhas contas para comprovar — relata outro lojista.

Rotina de violência

A Rua Leopoldo, um dos acessos ao Morro do Andaraí, patrulhada pelo blindado da Polícia Militar — Foto: Madson Gama
A Rua Leopoldo, um dos acessos ao Morro do Andaraí, patrulhada pelo blindado da Polícia Militar — Foto: Madson Gama

A região do Andaraí vive rotina de tensão motivada também por frequentes confrontos por disputa de território entre traficantes dos morros do Andaraí, dominado pelo Comando Vermelho, e do Cruz, controlado pelo Terceiro Comando Puro.

Na quinta, um dos acessos ao Morro do Andaraí, a Rua Leopoldo, era guardado por um blindado da Polícia Militar. De acordo com agentes da corporação consultados no local, eles estavam de prontidão para evitar um confronto. A Polícia Militar informou que, assim que tomou conhecimento de possível ação criminosa por disputas territoriais nas proximidades da Grande Tijuca, agentes do 6ºBPM, em conjunto com a UPP Borel, intensificaram o policiamento no local. Questionada sobre as extorsões, a corporação não respondeu.

A Polícia Civil informa que as denúncias serão apuradas pela 20ª DP (Vila Isabel).

No último dia 27, um tiroteio deixou um homem morto na esquina das ruas Leopoldo com Dona Amélia, a cerca de cem metros da Paróquia de São Cosme e São Damião. e interrompeu a missa.

— Não temos sensação de segurança para transitar na área, infelizmente. É ruim para todo mundo — lamentou um morador.

Fonte: extra.globo.com/Por Madson Gama — Rio de Janeiro

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *