Dino tentou resolver um problema e criou outro adicional, diz sócio de gestora sobre decisão do STF

Goldberg: Brasil tem várias leis interterritoriais Foto: Celso Júnior/Estadão

No dia seguinte ao que os bancos perderam quase R$ 42 bilhões em valor de mercado, por conta do crescimento das tensões em torno da aplicação da Lei Magnitsky sobre o ministro Alexandre de Moraes do Supremo Tribunal Federal (STF) e da decisão do também ministro Flávio Dino, para tentar blindar seu alcance, os presidentes de algumas das maiores instituições financeiras do País recusaram-se a falar do tema.

Participantes do encontro anual do banco Santander, que reúne boa parte do mercado financeiro no Hotel Grand Hyatt, em São Paulo, Milton Maluhy (Itaú), Roberto Sallouti (BTG Pactual) e Mario Leão (do próprio Santander) falaram sobre vários assuntos num painel na tarde desta quarta-feira, 20, mas se recusaram a responder perguntas sobre o tema. A presidente do Banco do Brasil, Tarciana Medeiros, cuja presença estava confirmada, não compareceu.

O único a falar publicamente sobre o que era comentado em conversas nas quais os interlocutores pediam para não ser identificados, nos corredores do evento, foi Daniel Goldberg, sócio da gestora Lumina Capital e ex-secretário de Direito Econômico do Ministério da Justiça entre 2003 e 2006. “Com as melhores intenções, o ministro Flávio Dino tentou resolver um problema agudo da diplomacia brasileira e da relação com os Estados Unidos e terminou não resolvendo o primeiro problema e criou um grande problema adicional”, afirmou, numa das palestras.

Isso porque, disse Goldberg, é comum que leis criadas em determinado país gerem efeitos sobre atos e condutas praticados em outra nação. “O Brasil tem várias (leis nessa categoria)”, disse ele. “A Lei de Defesa da Concorrência, por exemplo, tem aplicação interterritorial, já que o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) várias vezes toma decisões que afetam compra e venda de empresas que aconteceram fora do Brasil e com atores que nada têm a ver com o País.”

Ele citou como exemplo a compra da Monsanto pela Bayer, que afetaria profundamente a competição no mercado de agronegócio brasileiro. “Ninguém imaginou que, como eram duas empresas estrangeiras, o órgão brasileiro não se posicionaria a respeito”, afirmou Goldberg. “A aplicação extraterritorial da lei é um fenômeno relativamente comum, como acontece também com leis anticorrupção.”

Para ele, do ponto de vista do Tesouro americano, não faz diferença se o STF determinar se uma lei dos EUA tem ou não aplicabilidade no Brasil. “A sanção, com a retirada de toda e qualquer interface e interconexão com o mercado americano, é mais do que suficiente para dar efetividade à lei”, disse. “Na prática, o Supremo dizer que a lei não pode ser aplicada de maneira concreta parece ter sido uma bala de prata que resolveu o problema, mas não resolveu nada e criou um problema adicional, já que se criou agora um conceito novo de que qualquer lei interterritorial não pode ser aplicada aqui.”

Luis Stuhlberger, da gestora Verde Asset Management, disse não acreditar que a crise vá escalar a ponto de retirar bancos brasileiros do Swift (sistema internacional de trocas entre instituições financeiras). Para ele, o pior das sanções americanas já ficou para trás. “Depois que o lobby empresarial agiu – e continua agindo – nos bastidores, a impressão que dá é que o modo ‘vamos colocar o Brasil de joelhos para salvar o Bolsonaro’ não é mais o principal assunto da Casa Branca.”

De acordo com Stuhlberger, o principal temor agora se dá em torno de uma escalada, seja do Supremo ou do presidente Lula, em nome da soberania nacional e dos dividendos políticos. “O que eu mais tenho medo é de o governo brasileiro ir em cima das Big Techs (as gigantes de tecnologia dos EUA)”, disse. “Por hora, o assunto é político, já que até agora o Brasil não fez nada para prejudicar empresas americanas.” Ao avançar sobre as Big Techs, o Brasil colocaria o problema em um nível muito maior, disse ele.

Fonte: msn.com/História de Cristiane Barbieri

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *